Por Aline Coelho Xavier Previdelli
Educadora e pesquisadora independente – Blog IA Inclusiva na Prática

Você já viu uma criança que chora quando molham o rosto, se assusta com o barulho da moto na rua, rejeita etiquetas da roupa ou não tolera certas texturas?
Para muitos adultos, isso ainda é interpretado como “manha”.
Para a ciência, isso é perfil sensorial.
E quando damos nome ao que a criança sente, a culpa diminui, o cuidado aumenta — e a inclusão finalmente começa.
Uma história que acontece em muitas famílias
Durante muito tempo, eu achava que a sensibilidade da minha filha no banho era apenas incômodo.
Até perceber um padrão:
- ela procurava minha blusa ou o short do pai para enxugar o nariz
- não tolerava molhar o rosto
- assustava-se com barulhos de moto ou escapamento
- precisava de previsibilidade sensorial e acolhimento
Não era birra.
Era o cérebro dela tentando se proteger.
Essa situação se repete diariamente em milhares de casas no Brasil, em Portugal, Angola, Moçambique, Cabo Verde e toda a comunidade lusófona, mas a maioria das famílias nunca recebeu uma explicação clara sobre isso.
O que é o Transtorno do Processamento Sensorial (TPS)?
O Transtorno do Processamento Sensorial (TPS) é uma condição em que o cérebro tem dificuldade em processar, organizar e responder aos estímulos do ambiente.
Isso inclui:
- sons
- luzes
- toque
- temperatura
- movimento
- cheiros
- pressão
- texturas
Para algumas crianças, tudo isso pode ser:
👉 forte demais
👉 rápido demais
👉 inesperado demais
Para outras, é fraco demais, e elas buscam estímulos intensos para se regular.
Isso não é frescura.
Isso é neurodesenvolvimento.
TPS é um diagnóstico oficial?
Ainda não consta no DSM-5, mas é:
✅ reconhecido e estudado pela neuropediatria
✅ amplamente trabalhado na Terapia Ocupacional (Integração Sensorial – Ayres)
✅ comum em TEA, TDAH e atrasos do desenvolvimento
✅ cada vez mais investigado pela neurociência infantil
Ou seja:
É real, é estudado e precisa ser compreendido.
Principais tipos de perfis sensoriais
1. Hiperresponsivo (hipersensível)
O estímulo chega forte demais.
- incômodo com molhar o rosto
- irritação com etiquetas
- rejeição de texturas
- medo de barulhos
- rejeição de toque inesperado
2. Hiporresponsivo (baixa resposta)
O estímulo chega fraco demais.
- parece “desligado”
- não responde quando chamam
- busca estímulos mais intensos
3. Buscador de estímulos (sensory seeker)
A criança busca movimento ou intensidade.
- pula sem parar
- toca tudo
- gira
- procura contato físico mais forte
4. Dificuldade de discriminação sensorial
Dificuldade em diferenciar estímulos.
- confunde sons
- tropeça com facilidade
- dificuldade de escrita motora
Sinais de TPS que merecem atenção
- choro com barulhos
- incômodo extremo no banho
- sensibilidade a cheiros
- seletividade alimentar por textura
- irritação com roupas
- dificuldade em cortar cabelo ou unhas
- medo de ambientes movimentados
- necessidade de previsibilidade
- reações emocionais intensas a estímulos leves
Esses sinais não fecham diagnóstico, mas indicam que a criança precisa de apoio sensorial.
Como o TPS impacta comportamento e aprendizagem
Um sistema sensorial sobrecarregado pode gerar:
- irritabilidade
- dificuldade de concentração
- recusa de atividades escolares
- crises de choro
- comportamentos que parecem “desobediência”
- fuga de situações desconfortáveis
Mas no fundo…
Não é a criança que precisa se adaptar ao ambiente.
É o ambiente que precisa se adaptar à criança.
TPS e sua relação com TEA, TDAH e atrasos do desenvolvimento
A ciência mostra que:
✅ 90% das pessoas autistas têm alterações sensoriais
✅ 40% das pessoas com TDAH têm respostas sensoriais atípicas
✅ atrasos globais também podem incluir perfis sensoriais irregulares
Por isso, observar o perfil sensorial é fundamental, independentemente de diagnóstico.
Como a IA pode apoiar crianças com TPS
1. Checklist sensorial com IA
O professor ou responsável preenche sinais →
A IA processa →
Gera um mapa sensorial preliminar com:
- hipóteses de perfil
- gatilhos
- necessidades
- rotinas de regulação
2. Adaptações automáticas na sala de aula
A IA sugere ajustes personalizados conforme o perfil:
- redução de estímulos auditivos
- atividades com menor carga sensorial
- alternativas táteis e visuais
- rotinas estruturadas
- instruções claras e preditivas
- organização espacial mais calma
3. PEI Inteligente com perfil sensorial
Isso é inédito no Brasil e na comunidade lusófona.
A IA gera:
- objetivos funcionais
- estratégias para cada sistema sensorial
- orientações para família
- sugestões de intervenção
- fichas de acompanhamento
O PEI passa a ser personalizado, funcional e vivo.
4. Materiais didáticos adaptados pela IA
A IA cria versões acessíveis:
- menos estímulos visuais
- texturas visuais suaves
- opções para crianças sensíveis ao toque
- atividades alternativas para crianças buscadoras de movimento
- instruções passo a passo
- interações preditivas
5. Turminha Inclusiva representando perfis sensoriais
Cada personagem ajuda a criança a se reconhecer:
- Nico → sensorial auditivo / movimento
- Loli → investigativa, detalhista, sensível
- Luna → tátil sensível
- Beni → proprioceptivo
- Sofia → equilíbrio sensorial
Sempre com acolhimento, pertencimento e representatividade.
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Como apoiar uma criança com TPS no dia a dia
- avise antes de tocar
- introduza estímulos gradualmente
- reduza barulhos fortes
- ofereça alternativas sensoriais
- permita objetos calmantes
- dê previsibilidade (“agora vamos molhar devagarzinho”)
- acolha sem julgar
Crianças sensíveis são profundas, perceptivas e intensas.
São joias, assim como minha Lolo 💛
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Conclusão: conhecimento gera cuidado
Antigamente, a falta de nome gerava julgamento.
Hoje, a ciência e a educação inclusiva geram compreensão.
O TPS não é modinha — é neurodesenvolvimento.
E quando entendemos, podemos apoiar.
Quando apoiamos, transformamos.
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Referências
Ayres, A. J. (2005). Sensory Integration and the Child. Western Psychological Services.
(Clássico mundial sobre Integração Sensorial – base do TPS)
Ben-Sasson, A., Carter, A. S., & Briggs-Gowan, M. J. (2009). Sensory over-responsivity in elementary school: Prevalence and social-emotional correlates. Journal of Abnormal Child Psychology, 37(5), 705–716.
Miller, L. J., Nielsen, D. M., Schoen, S. A., & Brett-Green, B. (2009). Perspectives on sensory processing disorder: A call for translational research. Frontiers in Integrative Neuroscience, 3(22).
Schoen, S. A., Miller, L. J., & Green, K. E. (2008). Pilot study of the Sensory Over-Responsivity Scales. American Journal of Occupational Therapy, 62(4), 393–406.
Tomchek, S. D., & Dunn, W. (2007). Sensory processing in children with and without autism: A comparative study using the Short Sensory Profile. American Journal of Occupational Therapy, 61(2), 190–200.
Dunn, W. (2014). The Sensory Profile 2: User’s Manual. Pearson.
(Base mais utilizada para avaliação clínica dos perfis sensoriais)
Baranek, G. T. (2002). Efficacy of sensory and motor interventions for children with autism. Journal of Autism and Developmental Disorders, 32(5), 397–422.


